Selma Fernands de “Alma Nua”
De projeto novo, a cantora e compositora de Itapevi que abrilhantou o programa The Voice, da Rede Globo, participou do show beneficente realizado pela Comunidade Quem é di Sambá.
Domingo de sol. O toque estridente do xequeré ecoa pelo espaço que possui dimensões de um galpão. Um Lava Rápido é o local que aguarda a cantora e amiga da maioria dos ali presentes. A Comunidade inicia sua apresentação evocando “axé” (àse) por meio de seu repertório pegado nas raízes afro. Sem demonstrar hesitação o público estende os braços e chacoalham as mãos para receber a energia dita sagrada de acordo com as crenças afro-brasileiras.
“Olha a Selma ali! ” – Ainda no portão de entrada, a cantora, que iniciou sua carreira com os mesmos que ali tocavam, é recebida aos abraços pelos amigos. De modos polidos e sorriso acolhedor no rosto, Selma Fernands é apresentada a mim juntamente ao seu marido e assessor, Gabriel Berttolato, um rapaz alto de cabelos rebeldes e óculos redondos, o músico acompanha cada passo da cantora que sai a cumprimentar todos os conhecidos.
O Começo
Criada em meio a boa música, seu pai foi o primeiro responsável por sua influência musical. “Ele tinha uma vitrolinha antiga e escutava John Lennon, Roberto Carlos e muitas obras de Nelson Gonçalves”, conta Selma. Conforme crescia, diz ter se apaixonado por artistas como Nara Leão, Vinícius de Moraes e Elis Regina, interprete esta, responsável pela maior parte de seu aprendizado. Ansiosa pelo momento de subir num palco, a cantora foi apresentada ao grupo Quem é di Sambá, na época conhecidos como ReflexSamba. Da “canjinha” programada para o domingo seguinte, Selma Fernands mostrou realmente “ter o sol na mão” ao interpretar a música “O Homem falou”, de Gonzaguinha. “Aprendi muito com eles, então conheci e fiz participações com outros grupos da região”.
The Voice
Em busca de um lugar mais tranquilo para falarmos sobre o momento “divisor de águas” na vida da cantora, fomos direcionados para a rua lateral ao show; onde uma varanda aconchegante nos aguardava tendo sido preparada cuidadosamente pela senhora amável que gentilmente nos recebeu, Dona Marluce Belisário. Já acomodada, Selma trata com prazer sobre o assunto que a colocou à frente das telinhas de todo o Brasil. Embora “não tenha passado para a próxima fase”, como prefere descrever o momento decisivo que passou frente a frente com a sua oponente no ringue, Gal Silva, a entrevistada parece não carregar nenhuma desavença da competição, “na realidade, não havia competição entre os candidatos, peguei uma turma muito boa. Somos amigos e mantemos contato até hoje”.
Entre os momentos de recordação do programa, as risadas correm fáceis pela varanda que era refrescada por um ventilador a nossa frente. O ingresso de Selma no The Voice aconteceu após sua segunda tentativa, na qual enviou uma capela faltando quatro dias para o encerramento das inscrições. Os olhos da cantora ainda parecem brilhar ao simular atender ao telefonema da produção da Globo. “A mão de Deus pah em mim – fui pra televisão”, diverte-se. “Jesus o Brasil inteiro chorou… a gente que te conhece chorou…”, intervêm emocionando o amigo da cantora que assistia a entrevista sentado sobre o baixo muro da varanda.
A inspiração para a segunda tentativa de participação no programa é marcada na entrevista por consternação. Pouco tempo antes de sua inscrição, Selma perdeu uma irmã com câncer. “Minha irmã ouvia muito uma canção de Milton Nascimento, chamada Canções de Momento, logo após a morte dela falei para o Gabriel que iria me inscrever…”
Alma Nua
A artista que hoje vive da música busca inspiração do “povo do além”, “Cartola, Inezita Barroso, Jovelina Pérola Negra e é claro, Elis”. Sempre com um pezinho na arte, a cantora diz que hoje a arte a está levando. Quer mostrar a sociedade que do gueto também vem muita coisa boa. “Quero quebrar essa ideia de que na periferia só tem música ruim, quando não é! Cartola veio da comunidade, do mesmo nicho que eu, e é um dos grandes nomes da Música Popular Brasileira – hoje! Na época não era…”, conta Selma.
Sempre recorrendo aos olhos do sistemático marido e assessor, a cantora nos conta sobre seus projetos. Entre apresentações e projetos integrados, Selma está em parceria com André Fernandes, Isabela Moraes, Márcio Pazin e o produtor Edu Capello para realização do show autoral: “Alma Nua”. Show imperdível para os que são entregues ao sabor do Samba e da MPB.
Antes de voltar à roda de samba, onde a entrevistada não pôde deixar de tomar uma cervejinha e arriscar confiantes passos de samba, contou como sua visão sobre a vida mudou após o sucesso na mídia (embora amigos afirmem que todo seu sucesso é apenas reflexo da grande pessoa que Selma é), “tudo mudou! Minha cabeça mudou, o modo de me ver inserida na família e na sociedade, comecei a perceber de modo diferente as pessoas…”, conta a cantora.
A garota do subúrbio que carrega histórias de luta, encerra sua entrevista deixando claro que o momento de ascensão que vive é resultado de quem insistiu num sonho e fez todos os que duvidaram “…entender que um sonho não é brincadeira”.